A concretização do conteúdo material do conceito de especial complexidade é relevante para que o mesmo não se torne um expediente orientado a ser usado apenas em termos de obter a legitimação do excesso de prazos, nomeadamente os de prisão preventiva.
É, por isso, interessante, a definição contida no Acórdão da Relação de Évora proferido a 10.09.2024 no [proferido no processo 62/21.7JBLSB-J.E1, relator Renato Barroso, texto integral aqui], quando nele se decide o que o sumário sintetiza:
«I – O juízo sobre a especial complexidade do processo constitui um juízo de razoabilidade e da justa medida na apreciação das dificuldades do procedimento, tendo em conta, nomeadamente, as dificuldades da investigação, o número de intervenientes processuais, a deslocalização de atos, as contingências procedimentais das intervenções dos sujeitos processuais, ou a intensidade da utilização dos meios.
«II – O juízo sobre a especial complexidade do processo deve consistir numa ponderação conjugada das concretas dificuldades suscitadas pelo procedimento já realizado e pelo que será expectável ainda ter de ser realizado, segundo critérios de razoabilidade e de proporcionalidade».
A fundamentação, mais desenvolvida oferece, no entanto, pistas úteis de reflexão, nomeadamente as que este excerto reflecte:
«Por conseguinte, a consideração de um procedimento como sendo de “excecional complexidade” tem de ser ponderada, em larga medida, à luz de espaços de indeterminação, mas pressupondo, sempre, uma rigorosa análise de todos os elementos do procedimento e uma pronúncia sobre a concreta configuração processual em causa, ou seja (e resumindo), tem de ser ditada, caso a caso, uma decisão prudencial sobre a questão. A “excecional complexidade” constitui, assim, uma noção que apenas assume sentido quanto avaliada na perspetiva do processo, considerado não nas incidências estritamente jurídico-processuais, mas na dimensão factual do procedimento enquanto sequência e conjunto de atos e revelação externa e interna de acrescidas dificuldades de investigação e/ou de julgamento, dificuldades essas com tradução visível nos termos e nos tempos do procedimento.
A decisão sobre a verificação da “excecional complexidade”, por isso mesmo, não depende da aplicação da lei a factos e da integração de elementos compostos com dimensão normativa, nem está tributária da interpretação de normas.
O juízo sobre a “excecional complexidade” assume-se, pois, como um juízo prudencial, de razoabilidade, de critério da justa medida na apreciação e na avaliação das dificuldades suscitadas pelo procedimento.
Feito este excurso teórico, e revertendo ao caso destes autos, o muito elevado número de ofendidos, as contingências procedimentais provenientes da necessidade de ouvir tais ofendidos (enquanto testemunhas) em diversos países estrangeiros, e o elevado número de crimes de roubo imputados ao ora recorrente, tudo serão elementos a considerar, de acordo com um prudente critério (de justa medida, de normalidade e de razoabilidade), para determinar se o presente procedimento apresenta ou não uma “excecional complexidade”».