Sobre o Tribunal Constitucional podem dizer-se muitas coisas, incluindo no que se refere à respectiva subsistência.
Pode notar-se em que medida, seguindo os tiques do antigo STA, se especializou numa geometria jurisprudencial de círculos nunca coincidentes em que a dimensão normativa da norma tida por aplicada não coincide com a dimensão normativa da norma suscitada como desconforme com a Lei Fundamental ou em que a lei de cuja inconstitucionalidade se trata nunca foi aplicada no caso nos termos em que se suscitam ou aplicada sequer, ou em que a dimensão prevenida não é nem a aplicada nem a delineada no recurso, enfim tudo quanto, a juntar aos critérios formais serviu de base à rejeição liminar e à improcedência dos recursos que lhe são colocados também em legítima defesa face ao encurtamento do segundo grau de jurisdição.
O que não pode é, em nome de uma lógica interesseira, ser o bom Tribunal quando profere decisões convenientes e o mau Tribunal quando profere decisões que não convêm.
A propósito dos cortes nos subsídios foi-lhe colocada a questão. Legitimaram-no, assim, considerando-o apto a decidir, nessa iniciativa todos mesmo os que propugnam pela sua extinção.
O Tribunal decidiu agora, desagradando a todos: considerou a norma inconstitucional – e aí os hurras! – mas não este ano – e aí os morras! – e abriu a porta a que o Governo para defender a igualdade – que o tribunal considerou estar em causa – ameace os privados de lhes cortar também os subsídios – e ai os fora!, fora!, dos ameaaçados ante os parcialmente beneficiados.
Ora as questões de princípio não são assuntos de interesse. O relativismo moral só diminui a argumentação.
O Tribunal comportou-se politicamente quando, em matéria de inconstitucionalidade, decidiu na base do sim, excepto, mas também.Agora estão todos contra ele: os impetrantes e os terceiros afectados. E estão estes contra aqueles.
É a unanimidade pela negativa.
Um dia o Supremo Tribunal de Justiça, que conviveu, legitimando-as, com normas cuja gritante desconformidade com a Lei Suprema do País é hoje mais do que patente, e cuja inutilização faz parte do património da nossa cultura jurídica, terá os poderes que cabem ao Palácio de Ratton. Este é o propósito estratégico. Penso que não terei de demonstrar a primeira afirmação nem de explicar a minha contristada convicção quanto à segunda.