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A “encomenda”

Leio neste acórdão aqui da Relação de Lisboa, que acabo de citar noutro postal, este excerto e confesso que fico chocado: «porém, pese embora a matéria de facto que foi dada como comprovada pelo tribunal “a quo”, ainda assim, nunca, à luz da mesma, o arguido poderia ter sido absolvido. E, nesta parte, a tarefa mostra-se-nos particularmente facilitada com o “Parecer” do Exm.º Prof. Costa Andrade, com o qual o recorrente instruiu o recurso, e que aqui se sufraga na sua plenitude. Dir-se-á que este estudo é fruto de uma “encomenda”, porventura até bem paga! […].
É que, vamos à questão, a ir-se até ao fim do argumento suscitado, todos os pareceres, de juristas ou de quem seja, passam a estar em dúvida porque são pagos, todos os que actuam remuneradamente na Justiça passam por suspeitos porque são pagos, o ser pago passa a ser razão para se pôr em crise a probidade e a honradez e assim, num aparte, se lança a lama da dúvida.
No caso, como se verá, até foi com base neste parecer que até poderia ser, segundo os juízes que assinaram o decidido, de «encomenda» e «porventura até bem paga», que o tribunal condenou o interessado. O que nem adianta nem atrasa quanto ao que está em causa. Em causa sim a frase, a ideia subjacente, o juízo moral implícito, o rebaixamento.
Confesso que há dias em que dá vontade de desistir. Quando nos vemos, os que vivemos do nosso trabalho nos tribunais, e tentamos que o mesmo seja sério e feito com probidade, não defendendo qualquer coisa de qualquer modo mesmo quando o contrário nos daria o benefício da “encomenda” ser “bem paga”, assim passíveis de sermos olhados, obliquamente.
Perdoem o desabafo pessoal, fazendo minhas as dores alheias. Deve ser de estar a chover, seguramente. É um sentimento de desolação.
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