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O agoniante momento da derrota

Estou certo que isto que escrevo a muitos dirá nada, sobretudo a quantos estão ante Direito como se ele não estivesse presente a tragédia da condição humana.

Estou certo porém, que quantos vivem nos tribunais como advogados aqui encontrarão um momento de si, tantas vezes frequente e reiteradamente doloroso.

O que publico resulta da leitura, este fim de tarde, do texto de uma conferência que Adelino da Palma Carlos, advogado, Bastonário da Ordem dos Advogados, primeiro primeiro-ministro após o 25 de Abril, proferiu a 24 de Março de 1953 na Sala dos Actos Grandes nas antigas instalações da Faculdade de Direito de Lisboa, a convite da Associação Académica e que antes proferira em Braga.

O meu exemplar, achado em alfarrabista e que é separata do n.º 13 da Revista da Ordem dos Advogados, publicado no ano seguinte ao do evento, vem dedicado em autógrafo do autor ao juiz desembargador Pinheiro da Costa e é, precisamente, o do espólio deste magistrado, assim assinalado em manuscrito do próprio na capa a 8 de Novembro de 1955.

Tantos anos depois, a leitura mantém-se actual. Sensibilizou-me este excerto que ilustra o teor da água-forte do pintor francês Jean-Louis Forain [1852-1933], impressa em 1925. Nas palavras emocionadas de Palma Carlos:

«A mãe pecadora a quem o tribunal decidiu tirar os filhos, que ela adora para além de todas as fraquezas da sua misérrima condição humana, é um farrapo…
A dor verga-a, domina-a, aniquila-a; e a sua expressão, é, toda ela, a expressão do sofrimento redentor.
A seu lado, o advogado : máscara pungente de sofrimento igual ; à sua própria tristeza da derrota, junta-se a amargura da cons­tituinte vencida.
Pode a consciência gritar-lhe que cumpriu o seu dever ; que todos os recursos elo seu saber e experiência, os empregou na defesa da causa ingrata.
No fundo da sua alma, há-de haver sempre a inquietação; uma interrogação há-de assomar-lhe aos lábios; uma dúvida há-de tor­turá-lo: Fui eu que errei ? Foi minha a culpa ?
E, no silêncio da noite interminável, enquanto os outros encontrarão no sono “a sombra em que a alma repousa”, de que fala Coelho Neto, o advogado vencido continuará a dirigir a si mesmo estas interrogações – para as quais nunca encontrará resposta».

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