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António Osório de Castro: a raiz afectuosa

By Novembro 19, 2021Abril 14th, 2022Não existem comentários

 

O tempo pesa e com ele as memórias. E à nossa volta aumenta a clareira dos ausentes. E com isso a solidão, sombra que persegue a esperança nos que nos sucedem.

Ontem recebi a tristíssima notícia do falecimento do meu Bastonário, António Osório de Castro, o poeta António Osório. 

Ao longo do empenhamento que fui tendo na vida e obra da nossa Ordem dos Advogados, foi-me dado conhecê-lo, com aquele acanhamento de embaraçada admiração que coloco na relação com os outros. 

Hoje, dia triste, as memórias surgem. Entre elas, a mais longínqua, a jubilosa ocasião em que me foi possível fazer, sob a sua presidência, a primeira ligação de um computador digital e por um primitivo modem acústico e rede analógica, a uma base de dados jurídicos, o CREDOC, em Bruxelas, facto de tal modo insólito que, ante a sala repleta e incrédula, como que se avizinhava, em surpresa, ao primeiro passo do Homem na Lua. O que hoje se tornou banal era então futurologia, e é de poetas antevê-lo por entre o nevoeiro dos prosaicos descrentes. 

E depois a última, os passeios aqui  tão perto, acompanhado pela sua filha Gabriela, em que, tomando Sol pelos jardins da Gulbenkian, já indeciso o passo e confusas as lembranças, mantinha o porte e a galhardia que lhe davam a nunca perdida aura de senhoria e elegância. 

Pelo meio os livros que teve a amabilidade de autografar e os que fui juntando, requintado o verbo, cuidadosa a tipografia.

Num blog que dedico às coisas da Literatura, vistas com os olhos das minhas incertas leituras, escrevi a 3 de Outubro de 2012 isto que aqui  deixo como homenagem dorida à sua figura, apontamento sobre umas breves memórias que nos deixou:

«Disseram-me da livraria que já o tinham e, regressado do Tribunal, fui buscá-lo. Li-o neste fim de tarde, em ordem arbitrária, apesar de ser uma biografia «evocações de um poeta», detendo-me sobre o que foi a sua vida como advogado – e meu Bastonário na Ordem que é a da minha profissão – e, seguindo, em trilho errático, pelas memórias do tempo vivido, o convívio com a literatura, as raízes da sua família.
 
«O título devia ser “Breve Autobiografia”. Só que dezenas de pessoas, de parentes, animais, bichos, árvores, trabalhadores rurais, que estão dentro dele, disseram já muito do que tinham a dizer». É assim, com este mote como se de São Francisco de Assis que o poeta António Osório abre esta narrativa na primeira pessoa, que acaba por ser singular porque resumida, como se um desfolhar da agenda de uma vida, recordando os prazos e as diligências que deram da vida o ser ao advogado António Osório de Castro.
Vim aqui escrever pelo que me comoveu a referência que faz a sua Mãe, ao publicar-lhe, tiradas da intimidade, uma das cartas que escreveu ao marido, desde que faleceu, e que regularmente lhe levava ao cemitério no Alto de São João.
 
Trata-se da primeira, redigida a 19 de Janeiro de 1968, no seu italiano natal, «um poema sem uma palavra a mais»:
«Caro Miguel
Non posso vivere lontano da te. Più il tempo passa e più sento la tua mancanza, anche nelle minime cose. La mia vita al tuo lato è sata una completa felicità, fra due periodi tormentosi. Quando giovanni, ho sofferto tanto per aspettarti: adesso sofro di pi`perchè sei che aspetti me. A riverdeci, Miguel carissimo La tua Giú».
Se um dia perguntarem o que é o amor, físico e para além dele, o amor integral, intangível e indizível, está aqui, no livro O Concerto Interior
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António Osório de Castro: advogado da espécie dos que, sendo exímios juristas, eram também, porquanto humanistas, seres de Cultura, fica como exemplo.
Em 2019 tive a honra de proferir, em improviso, a oração laudatória quando lhe foi conferida a Medalha de Ouro da nossa Ordem. Não ficou registo do que disse, guardo-o, sim,no coração, local de alegria breve e reduto de amor. 
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