A revisão introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto ao regime jurídico da revisão penal previsto no artigo 449º do Código de Processo Penal veio criar dois novos fundamentos deste recurso extraordinário:
-» uma decisão do Tribunal Constitucional que declare, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade de uma norma jurídica menos favorável ao arguido e que tenha servido de fundamento à sua condenação
-» sentença vinculativa do Estado português proferida por uma instância internacional.
Ambos os fundamentos são problemáticos.
O primeiro suscita, entre outros, o tema da compatibilização da competência do Tribunal Constitucional, estabelecida no n.º 3 do artigo 282º da Constituição, para decidir sobre a ressalva do caso julgado em função da inconstitucionalidade, com a competência que cabe ao Supremo Tribunal de Justiça para ser ele a determinar sobre tal matéria em sede de revisão, o que ao limite pode gerar, como conclusão a inconstitucionalidade do artigo 449º, n.º 1, alínea f) do Código de Processo Penal.
O segundo, o integrar a génese de tal inovação [a qual decorre da Recomendação R (2000) do Comité de Ministros do Conselho da Europa de 9 de Janeiro desse ano 2000 no sentido de garantir a execução do decidido pelas sentenças do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, execução cuja garantia cabe ao Comité de Ministros daquela entidade] com a circunstância de Portugal ter ido mais longe do que aquilo que fora recomendado e, assim, o preceito legal abranger toda e qualquer sentença, que vincule o Estado português, proferida que seja por uma instância internacional de natureza jurisdicional, como é o caso das que sejam proferidas pelo Tribunal Internacional de Justiça, Tribunal de Justiça da União Europeia e dos tribunais penais internacionais.
O Supremo Tribunal de Justiça, num seu recente acórdão, proferido a 13.04.2023 [3ª Secção, processo n.º 4778/11.8JFLSB-B.S1, relator Lopes da Mota, texto integral aqui] decidiu um caso em que estavam em causa estes dois fundamentos. Exclui o primeiro, por inexistir, no aresto emitido pelo Tribunal Constitucional, a força obrigatória geral que é exigência legal para legitimar a revisão; e quanto ao segundo, por ter entendido que uma «sentença do TJUE que, em recurso prejudicial, declara, ao abrigo do artigo 267.º do TFUE, uma diretiva inválida apenas se dirige diretamente ao órgão jurisdicional que colocou a questão ao TJUE; o facto de qualquer outro órgão jurisdicional dever considerar tal ato inválido, em resultado da obrigação geral de garantir o primado do direito da União, abstendo-se de praticar atos contrários que prejudiquem a sua efetividade (neste sentido se podendo falar de uma eficácia erga omnes – cfr. o acórdão TJUE C-66/80, de 13.5.1981), não lhe confere o estatuto de sujeito processual destinatário daquela decisão, de modo a que se deva considerar como uma sentença vinculativa fundamento da revisão».