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À conversa com Luís Bigotte Chorão

By Outubro 5, 2022Outubro 8th, 2022Não existem comentários

Inicia-se hoje neste espaço uma nova secção dedicada a entrevistas. Inauguramo-la com Luís Bigotte Chorão. Advogado, mestre em Direito, doutorado em Letras [História] pela Universidade de Coimbra, tem centrado a sua investigação e a sua escrita na área da História política e jurídica contemporânea. Uma conversa solta que poderia ser interminável. Falámos sobre a cultura jurídica, a sua actualidade, a necessidade.

Autor de uma vastíssima bibliografia, no final da conversa perguntei-lhe: «Que balanço faz entre o que escreveu e gostaria de ter escrito?». Respondeu-me: «Não farei ainda balanço. Esses balanços são um tormento. Tenho trabalhos em curso e outros projectados. E uma vida profissional muito intensa! Vamos prosseguindo…». Há, pois, uma promessa implícita de uma conversa inacabada. 

 

Vamos ao que intuo na sua escrita, no foco da sua preocupação, os temas portugueses na área do Direito pretérito. Pode afirmar-se haver ou ter havido um pensamento jurídico português, assim como teima em subsistir uma filosofia portuguesa?

Essa questão da existência ou não de um “pensamento jurídico português” parece-me andar associada, em primeiro lugar, a um pressuposto de originalidade desse pensamento e uma outra que é a da filiação nacional de certo conjunto de ideias.

Ora eu penso que um dos aspectos mais enriquecedores e diria até fascinantes do pensamento jurídico é precisamente o facto de ele resultar historicamente de contributos, os mais diversos, de proveniências as mais diferenciadas.

Assim, mais do que a identificação de um “pensamento jurídico português” que se caracterize pela sua originalidade e influência, o que eu tenho encontrado são personalidades que deixaram e deixam contributos próprios de reflexão sobre o jurídico, e que merecem máximo reconhecimento.

Dou-lhe um exemplo para o século XIX, podia dar outros: Silvestre Pinheiro Ferreira, cuja obra é hoje muito justamente objecto de atenção fora de Portugal. Se a chamada “filosofia portuguesa” teima, como diz, em subsistir, eu penso que a obra jurídica de certos autores portugueses não teima em subsistir. Subsiste.

Mas o que há em Silvestre Pinheiro Ferreira digno de ser notado actualmente?

Olhe, por exemplo, toda a teoria da representação política. Silvestre Pinheiro Ferreira tem uma obra notável e variada que interessa ao Direito. Ora interessa não apenas ao Direito, mas também à Ciência Política, à Filosofia, à Economia Política e não só.

Notando a sua importância, lembro apenas entre a vastíssima bibliografia passiva, o que escreveram José Esteves Pereira, Susana Videira, Beatriz Nizza da Silva.

Uma das suas predileções tem sido a imprensa jurídica, território pouco frequentado recentemente. Mas pergunta, talvez a ignorância, em algum momento do periodismo jurídico português houve uma linha de pensamento subjacente que se tenha traduzido na respectiva linha editorial, sendo expressão de uma filosofia, de uma linha de pensamento e não só colectânea de dispersos?

Desde cedo, como sabe, interessei-me pela investigação dos periódicos jurídicos portugueses. A imprensa é uma fonte extraordinária da história e da história jurídica.  E não corresponde à realidade que esse território não esteja a ser frequentado. Há até em curso um projecto de investigação internacional, animado a partir de Espanha, entre outros, pelo notável historiador do Direito, Carlos Petit.

Abeirei-me da imprensa jurídica, para a estudar sistematicamente, muito influenciado por uma linha de investigação proposta por um grande jurista-historiador, Paolo Grossi – que viria a ser presidente do Tribunal Constitucional italiano – e fundou os “Quaderni Fiorentini pel la Storia del Pensiero Giuridico Moderno”.

Tive o gosto de o visitar em Florença, e se eu já estava convencido da importância historiográfica do assunto, fiquei, com esse encontro, definitivamente conquistado. Lembro-o com saudade; deixou-nos em Julho passado.

O movimento da imprensa jurídica portuguesa iniciou-se nos anos trinta do século XIX com os “Anais da Sociedade Jurídica”.

Essa publicação surge, para utilizar as suas palavras, com uma ideia subjacente que se traduziu sem dúvida na sua linha editorial.

Mas qual a ideia?

A ideia era a de contribuir, no quadro da “Sociedade Jurídica”, uma associação cujos Estatutos foram, aliás, aprovados em Abril de 1835, para a reforma, uniformidade e perfeição da legislação portuguesa, estabelecendo a sua “inteligência prática”, propondo-se nesse domínio representar junto do governo e das câmaras legislativas os seus “defeitos” e “inconvenientes” e propor projectos destinados a aperfeiçoá-la.

Foi a  Sociedade Jurídica que encarregou, como sua tarefa inaugural, um dos seus associados, José Manuel da Veiga, de elaborar  um projecto do Regimento dos Advogados.

Reunindo advogados de Lisboa, e também magistrados, essa associação constituiu-se na verdade como uma antecessora longínqua da Ordem dos Advogados.

Aquela correspondência que refere na sua questão entre o periodismo no Direito e uma linha editorial nota-se em muitas outras publicações: na “Gazeta dos Tribunais”, na “Revista de Legislação e de Jurisprudência”, estudada exemplarmente por Guilherme Braga da Cruz, e em “O Direito”, publicações estas mais que centenárias – surgidas no contexto da publicação do Código Civil de 1867.

E também a “Gazeta da Relação de Lisboa”, que ganhou substância doutrinal no campo sobretudo da chamada “jurisprudência crítica”, sob a direcção de José Maria Barbosa de Magalhães, um jurista de primeira qualidade que circunstâncias familiares impediram de seguir a vida académica, e mais tarde de seu filho José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães, que foi professor da Faculdade de Direito de Lisboa, figura que aliás conhece particularmente bem.

Muitos outros exemplos poderia dar, notando que a tendência para a especialização, em vários casos, reforçou a coerência editorial.

Permita-me só uma alusão a um periódico de grande interesse cultural, muito relevante em domínios que nos são muito caros, como o Direito Penal, a Criminologia, a Medicina Legal. Refiro-me ao “Mundo Legal e Judiciário”, que foi fundado por uma figura singular, Alfredo Ansur, que rapidamente a deixaria ao cuidado de Fernão Botto Machado, solicitador encartado, colaborador de Tomás Ribeiro, um autodidata notável que viria a ser constituinte em 1911 e diplomata da República. E só lhe falo de publicações surgidas no século XIX! O século XX é a este respeito muito rico. Um dia se fará a sua história.

Por falar em coerência e indo ao encontro de uma área em que tanto tem escrito, chegou a 1a República a ter legislação consolidada que lhe definisse a fisionomia ou viveu, afinal, à mercê do seu errático percurso político?

Essa ideia do “errático percurso político” da República que coloca na sua pergunta coloca muitas questões e exige reflexão séria. Eu próprio, sem fazer juízos como aquele que o meu Amigo faz, tenho olhado e estudado a vida política e jurídica da Primeira República notando que o regime foi condenado e também se autocondenou, é verdade, a um percurso que a fez oscilar entre momentos de legalidade e momentos de excepção.

Em minha opinião, a solução constitucional de 1911, que inutilizou em grande medida a figura do Presidente da República no plano da solução das chamadas crises políticas, não lhe conferindo a faculdade de dissolução das câmaras, introduziu na vida político-institucional do regime um problema para o qual só tarde demais foi encontrada, com a revisão constitucional, uma “meia-solução”.

Independentemente desse mal originário que desgastou o regime, não faltou, porém, à Primeira República legislação a definir-lhe a fisionomia. Note que um dos temas debatidos e permanentemente adiados foi o da revisão da chamada “obra legislativa” do Governo Provisório, designadamente da Lei de Separação do Estado das igrejas, que contribui de modo decisivo para determinar ao regime uma fisionomia laicista e anticongreganista, mas anticatólica.

Era o horror ao Vaticano e a ideia de que seria possível e vantajosa a criação de uma igreja nacional, desvinculada de um poder hierárquico exterior.

A legislação relativa à família, ao divórcio, ao registo civil, à laicização do ensino, entre outra, definiu o regime.

Mas nem tudo conduziu a resultados…

Sim, na verdade frustraram-se muito projectos. Dou-lhe dois exemplos que nos dizem muito a ambos: a República nunca concretizou o seu Código Penal. E foi anunciada a sua redacção como constituindo uma intenção firme do Governo. Foi mesmo indigitado para elaborar o projecto um universitário prestigiado: Caeiro da Mata. Não houve Código e Caeiro da Mata seria anos mais tarde ministro de Salazar.

Segundo exemplo: a criação da Ordem dos Advogados. Acabaria por ser fundada em ditadura pelo ministro da Justiça Manuel Rodrigues Júnior, mas sejamos justos, o trabalho essencial tinha sido realizado por José Alberto dos Reis em colaboração com o ministro da Justiça Abranches Ferrão. José Alberto dos Reis não negou colaboração ao seu colega Manuel Rodrigues Rodrigues, em cuja indigitação para ministro da Justiça, em 1926, se admite que tenha tido uma palavra a dizer.

Mas insisto, sem querer parecer que provoco, mas talvez fazendo-o: houve uma 1a República de liberalismo jurídico ou a generalizada repressão antimonárquica e anticlerical, foi, afinal, aquilo em que aquele regime se corrompeu?

Volto ao tema que já referi: a legalidade e a excepção, essa bipolaridade em que viveu a República. Mas não exagere o José António.

Generalizada repressão antimonárquica e clerical? E a República ante as incursões? E a República das amnistias e dos indultos? E a conivência entre alguns bispos e muitos padres com a política monárquica?

Sabe quem viu com vistas largas o tema religioso em Portugal e os prejuízos dessas conivências? O papa Bento XV.

O Centro Católico organizou-se precisamente para separar águas. E convenhamos que, sem prejuízo das reivindicações da “consciência católica”, em que haveriam de insistir certos sectores da igreja ao longo do regime e depois durante a ditadura, as relações com a República foram-se desanuviando. A guerra mundial contribui, aliás, para isso.

Só assim se compreende que sendo Presidente da República, António José de Almeida tenha imposto o barrete cardinalício ao Núncio em Lisboa e que José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães tenha anos mais tarde proferido o elogio académico de D. António Mendes Belo.

Parece que esta conversa gravita entre dois eixos: coerência e originalidade nas ideias jurídicas portuguesas. Passemos para a Revolução de 1820, há tão pouco tempo já centenária. E, aqui vamos a outra pergunta: o que houve no nosso vintismo jurídico que não fosse francês?

Bom! Esta sua pergunta parece envolver uma certa perspectiva crítica, não sei se sobre o vintismo, se sobre a influência francesa ou se sobre o vintismo e a influência francesa.

E se assim fosse?

O que houve no vintismo que não fosse francês? Pois, respondo-lhe com amiga ironia, tudo o que não era francês. Lembre-se de Locke e de Bentham, sobretudo deste último que teve contacto directo com Portugal, contacto esse estudado por Catherine Fuller num texto muito interessante publicado no “Journal of Bentham Studies”.

E convém não esquecer a tradução de obras de Bentham  promovidas pela Constituinte.

E tudo o que chegava de Espanha: desde logo a Constituição de Cádiz mas também a doutrina constitucional.

A este respeito deixe-me referir o texto clássico do espanhol Ramon Salas traduzido por Lara d’Andrade em 1822 que teve segunda edição em 1835: Lições de Direito Público Constitucional.

E tenhamos presente a obra de juristas portugueses, desde logo os que tiveram responsabilidades políticas durante o vintismo, cujo pensamento próprio não pode ser subestimado, tanto mais que contribuiu decisivamente para aquele momento constitucional: Borges Carneiro, Fernandes Thomaz, Ferreira Borges, Silva Carvalho…

Numa reedição das “Lições de Salas”, José Luís Bermejo que assina um estudo introdutório, refere-se a essa obra como tendo sido escrita com maior originalidade, em comparação com outros textos do autor, desenvolvendo Salas o seu pensamento próprio sob os «auspícios» de autores famosos cujos escritos analisa criticamente.

Também por cá se passou coisa semelhante. Foi assim com o “Portugal Regenerado” de Borges Carneiro, em 1820 – que é uma raridade bibliográfica – em boa hora reeditado sob a direcção e com estudo introdutório de Zília Osório de Castro.

O que lhe digo não desmente, está claro, a influência francesa no vintismo, aliás directa e indirecta, historicamente compreensível como certamente concordará comigo. Mas é necessário reconhecer todo um outro vasto conjunto de influências.

O bicentenário da revolução de 1820 e da Constituição de 1822 permitiu como sabe fazer um ponto de situação dos estudos sobre o vintismo no âmbito de um Congresso recente, organizado sobretudo por quem na Universidade tem estudado a época.

E o que lhe digo está assinalado com autoridade por historiadores como António Hespanha, Miriam Halpern Pereira, de Zília Osório de Castro, José Luís Cardoso, Cristina Nogueira da Silva, Reis Torgal, Cristina Araújo entre outros.

Viajemos para mais próximo de nós e de novo a congruência das instituições políticas com as suas leis. Porque é que o “Estado Novo”, fruto da Revolução de 28 de Maio de 1926 e constitucionalizado em 1933, como Estado corporativo autoritário, nunca teve um Código Penal a que chamasse seu?

O Estado Novo trabalhou sempre com grande eficiência no domínio do direito penal e do processo penal recorrendo a legislação avulsa.

Já viu o meu Amigo, que aliás escreveu sobre o assunto, o que seria tratar no Código Penal o crime político?

Nem diga mais! Está respondido. E agora a sua pessoa, jurista, advogado, investigador, em tudo infatigável. No mundo da tecnocracia jurídica, da advocacia como indústria, da estatística como critério de avaliação do judiciário, faz sentido a História, faz falta a Filosofia para os que fazem do Direito profissão ou não se acha um ser isolado num mundo de raridades?

O Direito e a Justiça só podem compreender-se à luz da História e da reflexão filosófica. Dispensar da formação dos juristas essas disciplinas é limitá-los culturalmente, impedindo-os sequer de alcançarem a essência das suas profissões e o quadro de valores em que as devem exercer.

É preciso não desistir desse objectivo, e colocar em diálogo historiadores, juristas, filósofos, economistas, outros cientistas sociais. Posso testemunhar a importância desse “convívio” no plano da compreensão e interpretação do passado.

Fala, afinal, da sua opção de vida, da sua inesgotável curiosidade, do esforço a que meteu ombros e tantos resultados tem dado. Como é ler e escrever, esgotado o dia na sua profissão? 

Absolutamente libertador. É uma forma de descanso, sinceramente. As noites são longas e silenciosas, propícias à leitura e à escrita. Mas a vida profissional é muito pressionante e captura-nos.

E, já agora, uma manhã de Sábado entre alfarrabistas, que são como um prolongamento da sua própria casa?

Uma experiência fantástica. E não imagina o que lhes devo. Ensinaram-me muito. Foram escola para mim. Como comecei muito cedo as minhas andanças pelos livreiros alfarrabistas tive o privilégio de conhecer, conviver e ser amigo de uma geração que infelizmente já desapareceu.

Tenho muitas saudades de José Maria Almarjão e de Tarcísio Trindade e lembro com muita amizade o José Vicente. Passámos horas juntos à volta de livros, de jornais, de papéis. E o que eu gosto de ir aos alfarrabistas do Porto!

Meu caro Luís, terminamos com duas perplexidades, parecem corpos estranhos na sua linha de pensamento, extra-catálogo na sua tão vasta bibliografia. Primeiro, porquê Bernardo Lucas, como chegou a esse advogado defensor de anarquistas?

Não se trata de interesse por um “defensor de anarquistas”, mas interesse pelo anarquismo como realidade histórica que justifica atenção. E muito em particular pelo tema da repressão do anarquismo e da participação portuguesa no “Congresso Antianarquista de Roma”.

Lucas assumiu a defesa de anarquistas cumprindo com as suas obrigações de advogado. Felizmente as suas alegações foram publicadas. É um texto que merece a pena ser lido.

E eu que esperava escrever quatro páginas de enquadramento histórico alarguei-me, até porque entretanto identificara no Arquivo Histórico Diplomático, do nosso Ministério dos Negócios Estrangeiros, documentação relativa ao Congresso de Roma, classificada como secretíssima e que não tinha sido aberta até eu ter pedido para a consultar.

Bernardo Lucas era, também lhe digo, já um velho conhecido meu, advogado de muitos méritos, com o qual me cruzei pela primeira vez a propósito da defesa dos implicados na revolta do 31 de Janeiro no Porto, do crime de Marinho da Cruz, do caso Calmon e da defesa de Adelaide Coelho da Cunha e mais tarde da “Revista Jurídica” que dirigiu e se reveste do maior interesse:

Foi advogado no Porto, membro da “União Internacional de Direito Penal” e seria deputado democrático durante a República.

E já que falamos de Bernardo Lucas deixe-me só acrescentar que esse nome faz parte de uma galeria extraordinária de advogados que merecem ser estudados. Há uma história da advocacia que está por fazer.

E, no mesmo registo, que ideia foi a sua de estudar os asilos políticos de Humberto Delgado na Embaixada do Brasil e Henrique Galvão  na da Argentina?

Por duas razões essenciais: em primeiro lugar o interesse político desses pedidos de asilo, o de Humberto Delgado na Embaixada do Brasil e o de Henrique Galvão na Embaixada da Argentina, geralmente desvalorizados pelos historiadores da época, e em segundo lugar pela relevância jurídica do tema do asilo.

Para além de ficar esclarecida (a partir da documentação diplomática  existente no Arquivo do MNE) a posição dos embaixadores Álvaro Lins e Mairal nas suas negociações com o governo português, fica desmentida a tese de que a questão do asilo de Delgado era tema entre chancelarias. Não foi assim. Publiquei a correspondência trocada por Oliveira Salazar com Juscelino Kubitschek, provando que o tema, como agora se diz, escalou ao mais alto nível e demonstrei as tensões que o caso provocou entre Lisboa e o Rio de Janeiro e mesmo entre figuras do regime. Particularmente significativa é a proximidade a Álvaro Lins de Manuel Cavaleiro de Ferreira, que deixara então, havia poucos anos, a pasta da Justiça.

Proximidade? Mas não é uma estranha proximidade? Insólita?

Não é nada estranha! Desconheço as circunstâncias em que se conheceram, mas tornaram-se amigos. Ao tempo eram ambos católicos, o que os pode ter aproximado. Só uma relação de amizade explica a presença frequente de Cavaleiro de Ferreira na embaixada do Brasil para se encontrar com Álvaro Lins – sobretudo durante o asilo do general Delgado -, e mesmo em recepções, como a que foi organizada ao tempo em homenagem ao escritor Erico Veríssimo, de visita a Portugal. Note que em 1957 Manuel Cavaleiro de Ferreira presidiu ao III Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros. O que nessa ocasião disse sobre Álvaro Lins testemunha uma relação de amizade.

A História não pára de surpreender quando a olhamos sem preconceitos…

Álvaro Lins tinha formação jurídica embora se tenha dedicado desde muito cedo à escrita, crítica literária e ao ensino. E foi biógrafo de Rio Branco, além de académico de Letras.

E sabe quem era um admirador de Lins? António Ferro, que o recebeu aqui e lhe testemunhou altíssimo apreço intelectual e amizade. Lins que se formara no “Integralismo” brasileiro fez depois o seu percurso ideológico – que aliás a sua obra revela muito bem – tendo sido um adversário declarado e militante do nazismo e do fascismo. E detestava o general Franco. O salazarismo tratou de lhe criar a fama de inimigo de Portugal, mas do nosso País nunca foi inimigo, tornou-se, sim, inimigo de Salazar e do regime. E não lhe faltaram razões.

No livro “Missão em Portugal”, que foi prémio Jabuti, Lins refere a relação com Cavaleiro de Ferreira, que identifica com as iniciais LCF. Na verdade não era L era M! Desse livro esteve anunciado um segundo volume cujo plano indicava uma análise muito crítica do Salazarismo, mas que nunca chegou a ser publicado.

Penso que por hoje ficamos por aqui. Muito grato pela oportunidade. 

Meu caro Amigo, antes de terminarmos esta conversa, por sinal muito interessante, deixe-me agradecer-lhe ter-me incluído nesta nova rubrica do “Patologia Social”, do qual como sabe sou leitor frequente. Um dos aspectos que aprecio neste seu espaço é precisamente o reconhecimento de que o Direito é uma realidade essencialmente histórica. O seu gosto, que eu bem conheço, por essa dimensão essencial à compreensão do jurídico confere às suas entradas verdadeiro interesse cultural e nessa medida o José António, através do “Patologia Social” presta um serviço notável. Não o digo por amizade, mas porque responde sincerissimamente ao que penso.

Meu caro Luís, agora nem sei que diga. Oferece o seu tempo a este espaço e ainda agradece, quando a maior gratidão é minha, nossa, se me permitem os que forem leitores deste apontamento de conversa.

 

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