Determina o artigo 356º, n.º 7 do Código de Processo Penal: «7 – Os órgãos de polícia criminal que tiverem recebido declarações cuja leitura não for permitida, bem como quaisquer pessoas que, a qualquer título, tiverem participado na sua recolha, não podem ser inquiridos como testemunhas sobre o conteúdo daquelas.»
Por seu turno, estatui o artigo 129º, n.º 1 do mesmo diploma sobre depoimento indirecto: «Se o depoimento resultar do que se ouviu dizer a pessoas determinadas, o juiz pode chamar estas a depor. Se o não fizer, o depoimento produzido não pode, naquela parte, servir como meio de prova, salvo se a inquirição das pessoas indicadas não for possível por morte, anomalia psíquica superveniente ou impossibilidade de serem encontradas.»
Parece-me que o primeiro dos normativos, porquanto especial, se sobrepõe ao primeiro, traduzindo um comando inderrogável porque sem excepção. O inciso nele contido «cuja leitura não for permitida» talvez suscite a dúvida sobre a excepção, mas creio que ela é resolúvel: o facto de a fonte da informação não ter sido encontrada viabiliza o testemunho indirecto de quem a ouviu dizer, mas não sobre o conteúdo do auto em que ficou registado o que ela disse.
Sendo esta, por ilógica que pareça, a articulação entre os preceitos, tema é saber se o OPC, não podendo ser inquirido sobre o conteúdo do auto poderá ser ouvido em audiência sobre o que a testemunha inquirida disse desde que não se reporte ao auto, forma sofismática que então se encontrará de permitir o que parecia proibido.
Eis o que decorre do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 01.07.2021 [proferido no processo n.º 1747/18.0PBPDL.L1-9, relator Abrunhosa de Carvalho e texto integral aqui]: «I – Se não for possível localizar uma testemunha, nos termos do art.º 129º/1, segunda parte, do CPP, pode o tribunal valorar o depoimento do Agente da PSP sobre o que aquela disse.»