Eis o teor da Directiva anteontem emitida pela PGR sobre o tema da “Atuação Funcional do Ministério Público no Período de Vigência da Situação Excecional de Prevenção, Contenção, Mitigação e Tratamento da Infeção Epidemiológica por SARS – COV-2 e da Doença COVID-19 e Estado de Emergência”:
«Considerando,
Que a Organização Mundial de Saúde qualificou, no passado dia 11 de março de 2020, a emergência de saúde pública ocasionada pelo agente Coronavírus (SARS-Cov-2 e COVID19) como uma pandemia internacional;
Que, com fundamento na verificação de uma situação de calamidade pública, foi decretado o estado de emergência pelo Decreto do Presidente da República nº 14-A/2020, de 18 de março, e Resolução da Assembleia da República nº 15-A/2020, de 18 de março;
As medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19 constantes da Lei n.º 1-A/2020 de 19 de março, que, igualmente, ratificou os efeitos do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, dela fazendo parte integrante;
O conteúdo do Decreto n.º 2-A/2020, de 20 de março, que procede à execução da declaração do estado de emergência efetuada pelo Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de março;
O Despacho 2836-A/2020, de 2.3.2020, dos Gabinetes das Ministras da Modernização do Estado e da Administração Pública, do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e da Saúde, o Despacho conjunto n.º 3301-C/2020, de 15-3-2020, e o Ofício-Circular n.º 05/2020, de 17-3-2020 (DGAJ/DSAJ);
As orientações da Direção Geral da Saúde (DGS), em especial as Orientações 6/2020, de 26-2-2020, relativa aos Procedimentos de prevenção, controlo e vigilância em empresas, e 11/2020, de 17-3-2020, relativa a medidas de prevenção da transmissão em estabelecimentos de atendimento ao público;
Os Planos de Contingência adotados pela Procuradoria-Geral da República e pelas Procuradorias-Gerais Regionais;
A Deliberação do Conselho Superior da Magistratura divulgada através da Divulgação n.º 81/2020, de 20-3-2020, e ainda a Comunicação dirigida aos Magistrados judiciais, publicada através da Divulgação n.º 83/2020, de 25-03-2020;
Os Despachos da Procuradora-Geral da República de 20-03-2020 e 23-03-2020, sobre o funcionamento da Procuradoria-Geral da República e de constituição do Gabinete de acompanhamento e gestão do estado de emergência, e a sua composição, respetivamente, e
A Deliberação do Conselho Superior do Ministério Público de 27-03-2020, a qual tem por objeto a fixação de orientações para a realização presencial de diligências e julgamentos urgentes por parte dos Magistrados do Ministério Público,
Face ao evoluir da situação, de modo a garantir o cumprimento das atribuições e competências constitucionais e legais do Ministério Público e a defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, importa adotar para o período em que vigorar a situação de exceção, medidas excecionais em consonância com o contexto também excecional, e de acordo com as regras constantes dos diplomas legais citados, em especial a Lei n.º 1-A/2020 de 19 de março, a Constituição da República e as leis de processo.
Tudo em nome da manutenção do regular funcionamento do Estado de Direito Democrático e no justo equilíbrio do direito à saúde de todos, sem exceção, sendo indiscutível que ao Ministério Público estão atribuídas competências únicas a cujo exercício, salvaguardando a preservação da segurança comunitária, deverá continuar a corresponder, assegurando com responsabilidade e eficácia a relevante missão que lhe está constitucional e legalmente cometida, como peça fundamental integrante do órgão de soberania Tribunais, em prol da confiança que os cidadãos e a comunidade em si depositam.
Assim, ao abrigo do disposto na alínea b), do artigo 19.º, da Lei n.º 68/2019, de 27 de Agosto, que aprovou o Estatuto do Ministério Público, durante o período de tempo em que se verificar a situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS – CoV-2 e da doença COVID-19 (artigo 7.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março), adotam-se as seguintes diretrizes de atuação funcional a serem seguidas pelos/as Magistrados/as e Agentes do Ministério Público:
1. Durante o período a que se refere o artigo 7.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, aos atos a praticar no âmbito dos processos e procedimentos a correr termos nos tribunais a que se refere o citado preceito, incluindo no Ministério Público, aplica-se o regime das férias judiciais.
2. Por isso, durante o referido período, sem prejuízo do disposto nos números seguintes e na Deliberação do Conselho Superior do Ministério Público de 27-03-2020, serão tramitados e praticados atos processuais em todos os processos que, por imposição legal ou por determinação da autoridade judiciária competente, nos casos em que a lei o permite (vg. artigos 103º., nº.2, alíneas c) e g) do Código de Processo Penal1), revistam natureza urgente, ou quando estejam em causa direitos fundamentais, o que abrange a prática dos atos próprios dos Magistrados do Ministério Público e o seu cumprimento.
3. Porém, os atos processuais nos processos urgentes (urgência decorrente da lei ou de despacho do Magistrado titular) serão praticados através de meios de comunicação à distância, se tal for tecnicamente viável.
3.1. Nos casos em que tal se mostrar legal e operacionalmente possível, proceder-se-á à entrega eletrónica das peças processuais, sem prejuízo do que seja entendido, de modo minimamente fundamentado, pelo Magistrado, em face das circunstâncias concretas e das condições de segurança verificadas, e do que se estabelece na Deliberação do Conselho Superior do Ministério Público de 27-03-2020 quanto à realização presencial de atos e diligências.
3.2. Não existindo nenhuma dessas possibilidades (realização presencial ou à distância), os respetivos prazos suspendem-se.
3.3. Os suportes físicos e demais expediente necessário à tramitação de qualquer processo urgente, que não seja possível remeter por meios eletrónicos, poderá ser entregue fisicamente desde que respeitadas as recomendações emitidas pelas autoridades de saúde na sua entrega e manuseamento.
4. Quando não se mostre viável a tramitação de processo de natureza urgente através da utilização de sistema de “acesso remoto”, designadamente porque o processo não está integralmente digitalizado ou por esse acesso não ser tecnicamente viável, o despacho deverá ser assegurado por Magistrado que, de acordo com a organização do serviço que venha a ser definida pela estrutura hierárquica, se encontre em funções presencialmente no tribunal.
5. O restante serviço a cargo dos Magistrados do Ministério Público, apesar de suspenso quanto ao decurso dos prazos processuais, poderá, sempre que tal se mostre possível e adequado, v.g. face ao volume de serviço e aos concretos processos em causa e, mormente para recuperação de pendências, ser assegurado, através de meios de comunicação à distância, designadamente através de acesso remoto às aplicações informáticas de tramitação dos processos (via VPN), teleconferência ou videochamada.
6. Considerando o exercício do direito fundamental do Acesso à Justiça, nas suas diversas dimensões, os incidentes de aceleração processual devem ser remetidos à PGR, via SIMP, através do imediato superior hierárquico, e apenas instruídos com o respetivo requerimento.
6.1. Sempre que a consulta do inquérito for possível através de acesso remoto ou sistema VPN, deverá igualmente ser remetido, juntamente com o requerimento, um relatório sucinto enquadrador dos elementos essenciais que habilitem à decisão.
7. Sem prejuízo do determinado na Deliberação do Conselho Superior do Ministério Público de 27-03-2020, os Magistrados do Ministério Público decidirão casuisticamente a submissão ou não dos arguidos a julgamento em processo sumário, a realização do seu interrogatório não judicial ou a sua submissão a interrogatório judicial para aplicação das medidas de coação que na circunstância se imponham, ponderando as condições de segurança sanitárias disponíveis no Tribunal, a salvaguarda do interesse público associado à declaração do estado de emergência, a necessidade de proteção das vítimas e de imediata realização da justiça e, bem assim, a suscetibilidade de aplicação imediata de medidas de coação.
7.1. A estrutura hierárquica de nível imediatamente superior será informada das decisões proferidas no quadro aludido no ponto que antecede.
8. A atividade pericial solicitada aos Gabinetes Médico-Legais (GML), que não diga respeito a autópsias médico-legais (estas também com as condicionantes determinadas pelo INMLCF e a articulação necessária com os GML), exames sexuais e perícias em contexto de ofensas à integridade física, maus-tratos e violência doméstica em que esteja em risco a preservação e aquisição de prova, apenas deverá ser determinada mediante prévia articulação com o GML respetivo.
9. Deverão ser privilegiados os meios de comunicação à distância, na articulação a realizar, muito em particular com os órgãos de polícia criminal e outras entidades de apoio e coadjuvação, bem como com as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens.
10. Os Magistrados do Ministério Público deverão continuar a garantir uma articulação próxima com os OPC e com as CPCJ, considerando a eventual necessidade de orientação na readaptação de diligências a realizar ou já em curso que careçam de intervenção, face às limitações impostas durante o período a que se refere o artigo 7.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março.
11. Sem prejuízo do enunciado no número anterior, os Magistrados deverão reportar, via hierárquica, à Procuradoria-Geral da República os constrangimentos que se verifiquem em concreto na articulação com os OPC ou as CPCJ.
12. Especial atenção deverá igualmente ser conferida à necessidade de manter uma estreita articulação comunicacional com as estruturas da Rede Nacional de Apoio a Vítimas de Violência Doméstica, em pleno funcionamento, e cujos contactos atualizados podem ser obtidos no portal da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG) (https://www.cig.gov.pt/).
13. Os Magistrados do Ministério Público que não disponham de acesso remoto aos processos para poderem praticar atos processuais à distância deverão contactar as equipas de proximidade do IGFEJ para obterem a credenciação necessária para o efeito.
14. Os Magistrados do Ministério Público coordenadores e Diretores de Departamentos deverão articular com as equipas locais de apoio informático a promoção e disponibilização dos meios tecnológicos necessários para cumprimento da presente diretiva, nomeadamente os meios que permitem o trabalho remoto com recurso às TIC.
15. Na impossibilidade de desenvolver localmente as soluções tecnológicas referidas no ponto anterior, deverão os Magistrados do Ministério Público coordenadores e Diretores de Departamento representar a situação diretamente, com conhecimento aos respetivos Procuradores-Gerais Regionais, ao Departamento de Tecnologias e Sistemas de Informação da Procuradoria-Geral da República (DTSI), via SIMP, o qual deverá, se necessário em articulação com o IGFEJ, promover as soluções tecnológicas adequadas.
16. Os Magistrados do Ministério Público devem abster-se de comparecer no respetivo local de trabalho, privilegiando o teletrabalho e restringindo a sua deslocação a situações pontuais e imprescindíveis, mormente nos casos em que devam praticar atos processuais presencialmente nas situações objeto da Deliberação do Conselho Superior do Ministério Publico de 27-03-2020, de acordo com os termos e organização a definir pelos Magistrados do Ministério Público hierarquicamente competentes para o efeito.
17. Os planos de turno já concretizados para o período de contingência são acionados quando não seja possível assegurar a regra relativa às substituições legais.
18. O serviço de turno instituído para as férias judiciais da Páscoa será cumprido de acordo com os planos de turno já concretizados para o período de contingência.
19. Os Magistrados que marcaram férias pessoais para o período de férias judiciais da Páscoa poderão, se assim o desejarem, dá-las sem efeito, através de comunicação endereçada, consoante os casos, aos Magistrados do Ministério Público Coordenadores de Comarca, ao Procurador-Geral Regional ou ao Procurador-Geral da República, no prazo de 72 horas após a entrada em vigor da presente Diretiva.
20. Em caso de dúvida interpretativa, de concretização ou constrangimento funcional, deve a mesma ser reportada superiormente, via Procuradoria-Geral Regional, ao Gabinete de acompanhamento e gestão do estado de emergência da Procuradoria-Geral da República, no qual se encontram representados os Magistrados coordenadores dos diversos Departamentos e Gabinetes da Procuradoria-Geral da República.
21. A presente diretiva não prejudica os Planos de Contingência adotados pelas Procuradorias-Gerais Regionais, em tudo o que não contendam, devendo proceder-se à sua adequação nos casos em que se mostre necessário.
22. Na aplicação das determinações constantes da presente diretiva ter-se-á em consideração a disponibilidade dos Senhores Oficiais de Justiça afetos ao Ministério Público, de acordo com as orientações emanadas pelos seus órgãos de gestão, assegurando que, no cumprimento dos despachos e diligências, é possível cumprir as regras sanitárias emanadas pelas autoridades de saúde.
23. Os Magistrados do Ministério Público devem fazer uso do respetivo cartão profissional, atributivo de livre-trânsito, em todas as suas deslocações efetuadas no exercício das suas funções profissionais ou por causa delas.
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A presente diretiva entra em vigor na data da sua publicação no SIMP e no Portal do Ministério Público e cessa os seus efeitos na data em que produzir efeitos o Decreto-Lei que declare o termo da situação excecional.
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Publique-se no SIMP e no Portal do Ministério Público.
Comunique-se:
– A S. Excelência a Ministra da Justiça;
– Ao Presidente do Conselho Superior da Magistratura;
– À Diretora-Geral da Direção Geral de Administração da Justiça;
– Ao Diretor-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais;
– À Secretária Geral do Sistema de Segurança Interna;
– Ao Diretor Nacional da Polícia Judiciária;
– Ao Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana;
– Ao Diretor Nacional da Polícia de Segurança Pública;
– Ao Comandante-Geral da Polícia Marítima;
– À Diretora Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras;
– Ao Inspetor-Geral da ASAE;
– Ao Bastonário da Ordem dos Advogados;
– Ao Presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses;
– À Presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção de Crianças e Jovens.»