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Lembro-me do tempo em que o Diário da Republica vinha em papel, pelo correio e tinha de se abrir as folhas e organizar por vezes os cadernos, quando eram vários. Quando se colavam nos Códigos as folhinhas cortadas à tesoura, editadas pelo Dr. Ernesto de Oliveira, actualizando-os. Tempo em que as fichas de jurisprudência azuis e as de legislação brancas chegavam nuns saquinhos de papel pardo e se coleccionavam alfabeticamente, trabalho paciente do Dr. Simões Correia. Época em que não havia Internet nem a Colectânea de Jurisprudência. Em que se escrevia em papel selado, com uma cópia para o tribunal, outra para cada parte que vivesse em economia separada, mais uma de almaço para a reforma dos autos e a folha final em papel de seda, para o nosso arquivo e tudo a papel químico, mais o «radex» ou a borracha dura e a vassourinha para as emendas em todas e cada uma das folhas cada vez que uma pessoa se enganava.Em que não havia fax e pouquíssimos tinham telex.
Lembro desse tempo em que havia menos leis, duravam mais tempo e a jurisprudência era mais certa. Em que éramos uma família. Em que na Biblioteca da Ordem dos Advogados Dona Lita Scarlatti, o Senhor Homem de Figueiredo, o Senhor Malta Jotta e à noite o Senhor Joaquim Parro partilhavam simpatia e informação bibliográfica com os leitores, advogados, magistrados, estudantes de Direito e todos ali convivíamos com amigável espírito.Tempos em que, sob a Ditadura, se lutava pelas liberdades mas havia espírito de luta e respeito pela contenda.
Lembro-me, porque há dias em que uma pessoa, ao levantar-se da cama, para este mundo em que a informação está ao alcance de um click, a maquinaria nos simplifica a burocracia, e tudo parece fácil e moderno, imagina que na zoologia dos seres que povoa este mundo errático estamos piores todos e vivemos mais infelizes. Tornámos isto num lúgubre covil.
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