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Janeiro 2007: um mês sem gatos

* Tribunais

O presidente do Supremo Tribunal Administrativo, Santos Serra, afirmou que «os tribunais tributários estiveram “praticamente parados”, em 2006, devido às providências cautelares que “ocuparam todo o tempo” dos juízes. “São milhões de euros que ficam por cobrar, uma vez que os processos acabam por prescrever”, disse o juiz conselheiro, felicitando o facto de já no final do ano passado ter sido introduzida uma alteração que determina a suspensão da contagem dos prazos daquelas acções, a partir do momento em que dão entrada nos tribunais, tal como acontece nas acções cíveis». Milhões de euros por cobrar pelos quais ninguém responde! Para quê também? Mais milhão menos milhão..

* Blogoesfera

O ano abriu com uma iniciativa: um militante da blogoesfera, a quem se deve um esforço abnegado e altruísta digno de louvor, transformou o seu blog numa revista digital. Joel Timóteo, juiz de Direito, cidadão do Direito, obrigado!

* Escutas telefónicas: o apagão participado

Por Acórdão proferido a 10, o TC «julga inconstitucional, por violação do artigo 32º, nº 1, da Constituição, a norma do artigo 188º, nº 3, do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual permite a destruição de elementos de prova obtidos mediante intercepção de telecomunicações, que o órgão de polícia criminal e o Ministério Público conheceram e que são considerados irrelevantes pelo juiz de instrução, sem que o arguido deles tenha conhecimento e sem que se possa pronunciar sobre a sua relevância».

Ante tal Acórdão do TC, muitos liberais, imaginando, ingénuos, que os senhores juízes iriam, de futuro, em amigável diálogo com os arguidos e seus defensores, com procuradores e polícias confraternizando, escolher o que se apagaria e o que se conservaria do escutado, saudaram o decidido. Desconfiado, antecipei que de ora em diante ninguém mais apagaria nada do escutado, o privado, o íntimo, o secreto, tudo guardado ao lado do útil e probatoriamente relevante, a devassa total! Bruxo!

* Cartografia jurídica

Ficou a saber-se que, com o novo mapa judiciário, «a actual divisão territorial judiciária em 231 comarcas quase um tribunal por cada um dos 308 municípios – será completamente alterada. Portugal ficará dividido em apenas 32 circunscrições judiciais de base, coincidindo com as actuais 32 regiões administrativas desenhadas em 2002 para a distribuição de fundos comunitários – as NUT III (Nomenclaturas Unitárias Territoriais)». Que o Ministério tem mapa fica-se a saber, oxalá tenha bússola!

* Prazos para mortos, a correr aos fins de semana

Depois de serem os advogados e procuradores a sofrer na sua maior parte com os prazos a correr aos fins de semana, agora passaram a ser os tanatologistas: «o Ministério da Justiça vai criar um sistema na medicina legal, que obriga ao funcionamento dos respectivos institutos durante os fins-de-semana e feriados». Até aqui, o enterro esperava, a descoberta do crime entrava em descanso.

Duarte Nuno Vieira, presidente do INML, desdramatizaria a situação, lembrando que nos domingos e nos feriados as conservatórias estão fechadas, pelo que é “impossível” fazer funerais. “Além disso – acrescentou –mesmo que a pessoa seja autopsiada, é necessário que os cemitérios estejam abertos e que haja ordem do Ministério Público, o que não acontece aos domingos e feriados”. Como há sempre uma explicação que tudo justifica!

* Não liberdade incondicional

Foi preciso o Palácio Ratton para acabar uma indecência legal. A 8 de Janeiro o TC declarou «inconstitucional a norma do artigo 127º do Decreto-Lei n.º 783/76, de 29 de Outubro, na parte em que veda o recurso das decisões que neguem a liberdade condicional, por violação do princípio do Estado de direito, do direito à liberdade e do direito de acesso direito aos tribunais». Não tinha havido até agora legislador que tivesse coração ao menos para se lembrar de revogar esta lamentável situação!

* Reforma ou revisão penal

O Governo conseguia levar a sua a bom porto. No dia 8 de Janeiro, eram tornadas públicas três propostas de lei. Alberto Costa, que no início do seu cargo viu a cabeça a prémio, prosseguia a sua corrida pelo corredor da morte, mostrando, sob a batuta autoritária do primeiro-ministro, que quando os Governos querem, fazem! A filosofia «desencarceradora» da proposta de Alberto Costa em matéria de Processo Penal seria elogiada pelo deputado comunista António Filipe, Nuno Magalhães do CDS/PP diria que «o seu partido está de acordo “com a esmagadora maioria” das propostas do Governo». Só faltava os do PS estarem de acordo também… Em discurso directo o ministro diria: «“Tomei medidas de inspiração cavaquista”». Não duvidamos nem por um instante. Como lembrava o Dr. Soares «les beaux esprits se rencontrent».

– Proposta de Lei n.º 98/10 pocede à vigésima primeira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro – Ler in Proposta de Lei
– Proposta de Lei n.º 107/X, que cria um Sistema de Mediação Penal, aprovada em Conselho de Ministros de 2 de Novembro de 2006 – Ler in
Proposta de Lei n.º 107/X
– Proposta de Lei N.º 109/X, que aprova o Código do Processo Penal – Proposta de Lei

* Julgados de paz e mediação

Segundo dados tornados públicos, «no ano de 2006, entraram 5066 novos processos nos Julgados de Paz, o que representa um aumento de 43% face ao ano anterior». De acordo com a mesma fonte: «o tempo médio de duração de um processo nos Julgados de Paz continua a ser de cerca de 2 meses». Nada mau! Entretanto iniciava-se na Assembleia da República a discussão da nova lei sobre a mediação penal.

* Segredo de justiça

«Não tenho solução nenhuma para o segredo de justiça porque creio que será sempre violado», disse o PGR na Assembleia da República. Como já ironizei aqui, o caso já não é a violação do segredo de justiça, é ele ser alvo de autênticos atentados ao pudor…

* Aborto fiscal

«O aborto ilegal é um negócio sujo, que não é tributado», disse Maria José Morgado. Ao ouvir isto, o Fisco que já ataca as meninas da vida, um destes dias colecta o sexo solitário!

* Cravinho reduzido a pó

«João Cravinho anunciou que vai entregar no Parlamento dois projectos de lei em matéria de corrupção, mas o grupo parlamentar já garantiu que não os irá agendar, por os considerar “não adequados nem consistentes”», revelou o Jornal de Notícias que se começou a mostrar, desde o ano passado, curiosamente, um jornal muito bem informado sobre temas de justiça.

* O STJ em outsourcing

Sinal dos tempos, «o Supremo Tribunal de Justiça resolveu recorrer aos serviços externos da LPM para fazer a sua assessoria mediática». Não sabíamos que precisavam!

* Habeas corpus: os números

Segundo dados tornados públicos, «entre 1982 e 2006, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), a única instância com competência para decidir sobre habeas corpus, recebeu à volta de 250 petições. Uma média de 10 por ano. Cerca de 90 por cento foram indeferidas». Ante o princípio da «actualidade» que subjaz à jurisprudência daquele tribunal, as deferidas devem tê-lo sido porque alguém não esteve atento em tempo para corrigir a ilegalidade da prisão, inutilizando assim supervenientemente tal providência extraordinária!

* As verdades eternas, o viático da linha justa

«E é bem sabido que os burgueses passados ao campo da revolução dão na maioria das vezes em pernósticos. São duros, implacáveis e exigentes. A moral bolchevique beberam-na com tal ânsia que ficam permanentemente bêbados de verdade de linha justa, de posições correctas, tudo muito enfeitado de citações, penosamente tiradas de livros que, as mais das vezes, tiveram a sua época e foram brandidos mais como arma de arremesso ocasional do que como tratados de ciência política e social. Isso que agora parece tão claro, era nos tempos obscuros, difícil de perceber. E como não tínhamos o viático da origem proletária obrigavamo-nos a brandir os pequenos catecismos como verdades eternas», escreveu o inteligente MCR no desalinhado Incursões. Como nesta frase está tanta gente e tanta coisa! E ainda há quem diga que o MCR é prolixo! Ele que é tão económico nas descrições!

* Um dia na prisão

Soube-se que «cerca de 300 jovens vão ser convidados a passar um dia na prisão para conversar com alguns reclusos, um projecto da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais (DGSP), Instituto de Segurança Social e Direcção-geral de Desenvolvimento Curricular para prevenir a criminalidade. Em declarações à agência Lusa, o director-geral dos serviços prisionais , Rui Sá Gomes, defendeu que os jovens, ao contactarem com os reclusos, vão poder detectar o que está certo ou errado. «Os reclusos vão ajudar os jovens para que não cometam os mesmos erros», salientou, adiantando que a iniciativa vai ajudar a prevenir a criminalidade e sensibilizar os jovens para o exercício da cidadania responsável».

Na mesma lógica de sensibilização, porque não engavetar os que decidem propor e mandar os outros para a cadeia, só para verem como é? E já agora os que os defendem, só para saberem como não é. Seria a regra do não faças aos outros o que não gostarias que te fizessem a ti.
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